sexta-feira, 19 de novembro de 2010

palavras que poderiam ser minhas

O verbo voar

Eu não voo, tu não voas, ele e ela não voam, nós não voamos, vós não voais, eles não voam. Devia ser assim que nos deviam ensinar a conjugar o verbo voar, pelo menos no sentido figurado. É uma ilusão, isso de que as pessoas voam, uma ilusão que acaba quando se cai de cara no chão. E mesmo assim, continuamos a iludir-nos, a achar que estamos a caminho das nuvens quando só estamos em queda livre. As pessoas não voam, a gravidade atrai-nos para o chão e não temos asas para evitar esse efeito. As pessoas não voam, só pensam que voam enquanto ainda não se estatelam no chão. E isto vale para tanta coisa…

Onde é que eu já ouvi isto. Conheço um rapaz e penso que ele é diferente, que tem que ser diferente, que é especial claro que sim, que não posso estar enganada em relação ao carácter dele, que aquilo é açúcar nos olhos e não ruindade. A medo, esqueço os meus medos. Atiro-me de cabeça e sabe tão bem. Sabe bem o vento na cara e o frio na barriga, as noites em branco. Não quero dormir porque a realidade é melhor que qualquer sonho, e na cama revisito cada beijo, com saudades de momentos que ainda não nos aconteceram. Gosto tanto que dói. Isto devia indicar que já estou em queda livre, que a paixão preenche o espaço onde antes estava o amor próprio, o meu amor próprio. Quando o vejo sinto-me nas nuvens e penso que posso voar. Mas as pessoas não voam, eu nunca voei, só saltei e caí, mesmo que a queda tenha chegado mais cedo ou mais tarde. Um dia, acordo com o mundo de pernas para o ar e os olhos inchados, quero dormir o dia todo porque debaixo das nuvens levo com chuva e tempestades dia sim dia sim. Penso que aterrei mal, que devia ter visto os sinais e ter aterrado o meu coração de forma tranquila sem o desfazer em pedaços pela pista fora. Mas é impossível que a aterragem fosse suave, porque não estávamos a voar, estávamos a cair e era apenas uma questão de tempo.

O verdadeiro voo é conseguir ser feliz sem nos iludirmos, sem mentirmos a nós próprios, sem ter que saltar e fingir que estamos a voar. A verdadeira felicidade, aquela que pode durar é a que se conquista de pés no chão e coração cheio de amor pelos outros e por nós próprios.

http://srafeiticeira.blogspot.com/2010/11/o-verbo-voar.html

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